Em 2016 e 2017 a busca na internet pelos termos “jejum intermitente/ intermittent fasting” foi GIGANTESCA, o que mostra um interesse crescente sobre um tema que na verdade, já é bem antigo.
O jejum tem sido usado como uma prática religiosa e médica há milhares de anos. Benjamin Franklin, por exemplo, foi citado como dizendo: “O melhor de todos os medicamentos é descansar e jejuar”.
Então vamos tentar entender um pouco mais sobre essa prática milenar e para quê/como ela pode ser utilizada nos dias de hoje?
Dúvidas nos comentários, ok? Respondo o antes possível.
– Naturais (se não tem fome, não come): muitas pessoas não sentem fome pela manhã e acabam pulando essa refeição fazendo naturalmente um jejum de 14h a 16h.
– Protocolo 16/8: onde o jejum é feito por 16 horas (onde geralmente inclui-se o período do sono) e a pessoa se alimenta numa janela de 8 horas (de meio dia às 20h, por exemplo).
– Protocolo “alternate-day fasting”: jejuns de 24h alternados com um consumo alimentar “ad libitum” ou “à vontade” em dias intercalados.
Esses são alguns dos protocolos mais citados, mas existem diversas variações (inclusive a redução drástica no consumo calórico, com o consumo de menos de 25% das necessidades diárias em dias alternados, ao invés da total abstenção de alimentos).
O número de horas necessárias para que isso aconteça (geralmente de 12h a 36h) dependerá do conteúdo de glicogênio armazenado no fígado (se a pessoa vem comendo pouco carboidrato na alimentação, a reserva deve estar mais baixa, portanto, em um número menor de horas já será esgotada) e do nível de gasto calórico/exercício que o indivíduo tenha durante o jejum.
Durante esse período, os corpos cetônicos servirão como fonte de energia para sustentar a função das células musculares e cerebrais.
As evidências existentes (evidências essas que não são tantas assim: infelizmente temos poucos ensaios clínicos randomizados com bom número de participantes sobre o tema) mostram que esse padrão alimentar pode trazer efeitos benéficos à saúde no que diz respeito a melhora da sensibilidade à insulina, redução da inflamação, melhora da saúde cardiovascular (pela melhora do perfil de colesterol e redução de citocinas inflamatórias) e melhora da pressão arterial.
O emagrecimento também comumente vem atrelado ao JI e, seguramente, é parte da justificativa para os demais benefícios supracitados.
A redução na ingestão calórica é a principal explicação para boa parte dos benefícios relacionados ao jejum, inclusive para o emagrecimento.
Além do período do jejum em si, estudos mostram uma redução natural no consumo de energia nos dias subsequentes ao jejum. Um jejum de 24h ou a redução drástica no consumo calórico em um dia (redução de 75% do valor calórico total) mostrou reduzir a ingestão calórica em aproximadamente 30% durante os 3 dias subsequentes.
Um estudo com obesos observou que ignorar o café da manhã não levou a aumento na ingestão de alimentos no almoço após a manhã de jejum prolongada e não mostrou aumento no apetite pós-almoço.
Apesar de um estudo ter evidenciado que no JI pode haver aumento da grelina, hormônio relacionado à fome, a maior parte dos ensaios que avaliou humor/sensação de fome dos participantes encontrou efeitos positivos (poucos relatos de fome, irritabilidade ou sensação de pouca energia).
Esse ponto é bem importante, pois as recomendações para perda de peso frequentemente incluem conselhos para comer refeições frequentes e regulares (com vários lanches ao longo do dia) para evitar a fome. No entanto, a evidência atual sugere que os períodos de jejum não levam necessariamente a excessos.
É importante atentarmos que as revisões e meta-análises existentes que fazem a comparação entre protocolos de jejum intermitente (que alternam dias de jejum com dias de consumo “ad libitum” ou “à vontade”) com a restrição calórica “constante” mostram que os benefícios metabólicos e de perda de peso em geral dos regimes de jejum não são superiores à restrição energética convencional. Por isso, o que deve ser avaliado é o seu nível de conforto e adaptação às diversas estratégias existentes na hora de escolher qual utilizar.
A nível de prática clínica, pessoas com compulsão alimentar devem ter cuidado com essa abordagem. Tanto podem responder de maneira positiva (conseguindo utilizar o jejum como ferramenta para ter um controle maior sob a ingestão alimentar), quanto podem desencadear crises de compulsão com essa estratégia.
Por isso repito o que disse nos parágrafos anteriores: a estratégia de Jejum Intermitente aparentemente traz tantos benefícios quanto a redução calórica padrão.
Então se essa não é sua vibe ou não combina com seu perfil jejuar por várias horas, não há porque colocá-lo em sua vida.
Além de pessoas com problemas psicológicos em relação à alimentação, o JI não seria indicado para diabéticos em uso de medicamento (a não ser que haja acompanhamento de perto pelo nutricionista e médico para ajuste da medicação) nem para gestantes e lactantes – principalmente pelo fato de essas não serem fases para se pensar em fazer restrição alimentar a nível de volume calórico.
Qualquer pessoa com problemas de saúde específicos deve procurar aconselhamento nutricional para avaliar a inclusão de JI na rotina.
Assim como qualquer estratégia voltada para o emagrecimento (considerando que você utilize o JI com essa finalidade) – ou seja, onde há restrição calórica – invariavelmente você está exposto a um risco maior para a perda de massa magra.
Entenda bem: não estou dizendo que o período de jejum em si aumente as suas chances de perder músculos, mas o fato de você estar reduzindo a sua ingestão calórica de maneira geral lhe deixa mais propício à perda. Os estudos são contraditórios quanto a existência ou não de perda de massa magra durante a realização de protocolos de jejum (alguns mostram que sim, outros que não).
Isso ocorre porque durante um protocolo de emagrecimento (seja ele qual for) você a todo momento está enviando uma mensagem ao seu corpo: “meta a mão nas minhas reservas energéticas, pois o que virá via oral será insuficiente”.. o problema é que não dispomos apenas de gordura como reserva, nosso músculo também pode ser considerado uma opção. O que devemos fazer para minimizar as chances disso acontecer? TREINAR! Mostre ao seu corpo que seus músculos estão ali pois você de fato precisa deles! E claro: consuma uma boa quantidade de proteína nas janelas de alimentação para que haja reparação muscular.
Treinar em jejum pela manhã é uma possibilidade? Sim! Se você treina bem dessa forma (e até melhor do que se alimentando poucos minutos antes) não precisa mudar. Se o seu treino estiver forte/intenso e, principalmente, se o seu objetivo é ganhar massa magra, apenas evite continuar em jejum por muitas horas após o treino (tente comer, pelo menos, até 2 a 3 horas após) – isso evitará que o catabolismo proteico induzido pelo treino perdure por muito tempo.
Infelizmente ainda não dispomos de dados suficientes para determinar o protocolo de jejum ideal, incluindo o comprimento do intervalo de jejum e o número de dias de jejum por semana.
Se o seu objetivo é perder uns quilinhos, o mais importante que você deve lembrar, é que não precisamos fazer jejum intermitente para emagrecer. O emagrecimento está relacionado principalmente àquilo que comemos e não tanto às horas “a mais” que deixamos de comer. Por isso, coma comida de verdade, sem exageros em termos de quantidade, e tudo dará certo.
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